Morei na casa de meus pais a vida inteira e de lá só arredei definitivamente os pés no dia em que me casei, mal havia eu meus tenros 25 anos de idade. Mesmo já empregado, ganhando meu dinheiro com o suor do meu trabalho, dando aulas de variadas matérias em diversos cursinhos, desde preparatórios para concurso de sargento do exército ao antigo artigo 99, além das monitorias da Faculdade e dos plantões de estagiário em quase todos os hospitais psiquiátricos da cidade. Apesar de ter conquistado uma modesta independência financeira, o que me permitia alugar uma humilde quitinete no centro da metrópole, como faziam muitos amigos, preferi restar onde estava, na quietude do ninho caseiro, muito do bem instalado. Claro que não podia desfrutar de toda a liberdade que queria, mas a que eu tinha por demais me bastava, me satisfazia plenamente.
Não pagava aluguel, os generosos autores de meus dias não me deixavam ajudar nas despesas caseiras, tinha casa, comida e roupa lavada sem despender um único tostão furado, levando uma vida folgada, desfrutando das comodidades só oferecidas aos hóspedes de luxo. Saía e chegava na hora que me desse na vontade, sem precisar dar qualquer explicação de meus horários desencontrados, nem relatar pra onde ia e com quem. Nesse tempo, quando o filho adentrava os umbrais da universidade, os genitores imediatamente o promoviam ao ansiado estado de adulto, entregando-lhe um chaveiro com todas as chaves da casa como um precioso troféu duramente conquistado. Muito embora eu preferisse penetrar no sagrado recesso da casa paterna pela janela do meu quarto, ao regressar das primeiras noitadas boêmias, das aventuras noturnas que só tinham hora pra começar, jamais para terminar, de tão maravilhosamente infindas.
Logo, passava longe de minha jovem cabeça abandonar tamanho conforto para me aventurar em morar sozinho e abarrotar o juízo e minha vidinha mansa de cotidianas preocupações para mim indesejáveis, totalmente dispensáveis naquele momento da existência. A grana que ganhava era somente pra gastar comigo, com meus pequenos luxos e prazeres. Como se diz no jargão do futebol, em time que está vencendo não se mexe. Claro que eu não podia, feito os amigos que moravam sós, promover festinhas de arromba nem consumar conquistas sexuais entre as quatro paredes do meu quarto de dormir. Isso era o de menos, pois para que serviam os bordéis e as areias sempre acolhedoras das praias, o apartamento emprestado dos amigos do peito? Os becos da cidade, jardins, quintais das residências desocupadas? Satisfazer os instintos não era um grande e insolúvel problema, enfim. Dávamos nosso jeitinho, seja lá como fosse.
Nos dias que ora correm, aumenta cada vez mais o número dos que moram solitariamente, ou por opção de vida ou por imposições da vida. Tanto faz se são jovens, se são mais velhos. Solteiros, casados, viúvos. Todos desejam ter o seu cantinho, seu próprio mundinho onde possam viver segundo suas regras pessoais, cultivando uma ojeriza inamovível de dividi-lo com alguém. Talvez por haver sido criado no seio de uma família numerosa, nunca gostei da ideia de tornar-me um ermitão, sem ter ninguém a me esperar quando a meu tugúrio retornar após a labuta do dia a dia. Sou um animal gregário por natureza. Viver solitário, sem ter ninguém pra dividir o existir, conversar, fazer amor, alguém que me ajude a carregar minha cruz, nem pensar. Está fora de minhas cogitações. Solidão boa é aquela consentida, porém que você sabe provisória. Não aprendi a morar sozinho e creio ser-me impossível aprender agora. Nem quero
Nenhum comentário:
Postar um comentário