segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Airton Monte - Os Elefantes – 18 de Outubro 2011

Airton Monte - Os Elefantes – 18 de Outubro 2011

Embora faça um longo tempo que, por simples preguiça e comodidade, eu não vá mais ao cinema, principalmente depois que as salas de projeção estabeleceram domicílio no espaço confinado dos shoppings, ambientes pelos quais nutro uma ojeriza inenarrável, uma feroz antipatia que me é de todo impossível controlar, pois sinto, quando estou dentro deles, um vago acesso de claustrofobia mesmo não padecendo desse sofrido transtorno mental. Além do mais, como a maioria das pessoas, hoje em dia, esqueceram ou não lhe foram ensinadas as regras básicas de humana convivência civilizada, mal começa a projetar-se a película, nada de desligarem os malditos celulares, pararem de conversar alto como se estivessem numa feira livre, atrapalhando o desfrutar do prazer alheio. Como não sou de permanecer calado, conformado com a invasão do meu direito de assistir o filme posto em sossego, achei melhor me ausentar da magia da telona para evitar severas discussões.

Portanto, cinema agora para mim somente no sagrado recesso do lar, vendo nas tevês a cabo, sem perigo de algum desinfeliz acabar com a minha festa. Ou então, alugo um devedê e assim vou saciando a minha fome de modesto cinéfilo, me deliciando com preciosos clássicos que jamais perdem seu encanto, por mais que o tempo passe. Por essa razão, ainda não vi a última obra do interessantíssimo e polemico cineasta dinamarquês Lars Von Trier, chamado Melancolia que a crítica considerou belíssimo, embora seu autor tenha sido sumariamente expulso do último Festival de Cannes por haver soltado uma piada de mau gosto a respeito de Hitler e do nazismo. Neste mundinho paulificante do politicamente correto, é preciso tomar cuidado com o senso de humor, porque os patrulheiros ideológicos são incapazes de perdoar qualquer deslize que classifiquem de mal comportado e fuja dos padrões estabelecidos.
 

Li uma entrevista do controvertido artista, ateu por sinal, em que dizia: “Se Deus criou a vida, Ele logo a largou, correndo por aí, sem pensar no fato que criou seres que têm de enfrentar a consciência de que sua existência é finita. Isso é nascer sob uma sentença de morte”. O que me leva a pensar serem os elefantes os únicos viventes deste terráqueo planeta que sabem exatamente quando vão morrer. Ao chegar a hora, se despedem do bando e se vão, orvalhados de dignidade, ao encontro da morte. Saber quando se vai morrer. Uma tantálica tortura ou abençoada unção? Os elefantes não brigam contra a morte feito os seres humanos, tão carentes de imortalidade. Aceitam a morte tanto quanto aceitam a vida. Como se morrer fosse a coisa mais natural do mundo. E o pior é que é. Mas nós não nos conformamos com o ponto final. Todos nós, ateus ou crentes, trememos nas bases diante da perspectiva de ter de abandonar este vale de lágrimas.
 

Aliás, eu nunca consegui entender claramente por que aqueles que acreditam num paraíso após o humano passamento têm tanto medo da morte quanto eu, que há muito deixei de crer até em Papai Noel. Entanto, voltando à vaca fria, agora que o boi saiu da linha, o que faria eu se soubesse sobre o morrer o que sabem os sábios elefantes? De repente, acordar um belo dia e sentir a premonição fatídica que este seria o meu último dia de vida? Haveria um tamanho desespero em mim ou apenas uma filosófica resignação? Despertar um dia e dizer para mim mesmo: é hoje! E encarar a realidade com a maior naturalidade possível, sem choro nem vela, sem fazer da terrível descoberta uma tragédia melodramática? De uma coisa estou certo. Nada revelaria às pessoas a quem amo. Para que fazê-las sofrer de véspera? Inventaria uma comemoração qualquer, o lado oculto do luto, a última lágrima do palhaço. Nada de morte solitária. Seguiria os versos da canção do Rodger Rogério:”Se a morte vier me encontrar, ela sabe que estou entre amigos, falando da vida e bebendo num bar”.

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