quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Airton Monte - O Hoje - 25 de Novembro 2011

Pois muito bem, bem, bem. Hoje, acordei pensando na vida, cogitando sobre a dura e ao mesmo tempo maravilhosa condição de ser, de existir, de estar no mundo como há tempos não fazia. O habitual é que a gente só se dedique, só se preocupe em pensar na vida quando nos encontramos afligidos pela tristeza ou, então, transidos de angústia porque ela(a nossa vida)não vem dando muito certo e as coisas não estão saindo do modo que desejamos. Devo avisar aos meus conterrâneos leitores que esse não se trata do meu caso em particular. Apesar dos pesares, acho-me relativamente em paz comigo mesmo. Não carecem de tanta importância os percalços, pois já estou deveras acostumado a enfrentar os que me aparecem pela frente, nem me assustam com feroz ansiedade alguns sinais de negras nuvens toldando meu conturbado horizonte existencial. Vou levando o barco do jeito que dá e posso, como sempre o faço, sem jogar a toalha no meio do ringue.

Somente despertei pensando na vida como bem poderia haver acordado matutando nas dezenas mágicas da loteria, movido por um sonho que me soprasse, benfazejo, um inacreditável palpite. Controlar completamente meus pensares é uma tarefa impossível para este pobre ser pensante como para todo mundo, desse modo suponho e acredito. Meus pensamentos são dotados de autonomia e liberdade para ir e vir dentro de minha cabeça desprovida de currais e de porteiras. Meus pensamentos são cavalos selvagens, infensos à qualquer tentativa de doma, a cavalgarem soltos pelas campinas, sem rédeas nem freios. Talvez o livre pensar seja só pensar, tal e qual afirmou o genial Millôr Fernandes. E com ele concordo sem pestanejar. Entanto, o que pensei sobre a existência num rápido instante da manhã, entre o banho e o desjejum, juro que não me lembro agora. Foi um pensamento tão veloz feito um cometa e que vestígios não deixou em minha frágil memória.

Quem sabe, tenha pensado, com inusitada alegria, num gol de letra que marquei num prosaico bate-bola de várzea no último minuto do segundo tempo, eu menino, gozando um pequeno instante de efêmera glória, mas que as crianças guardam para todo o sempre em suas mais doces recordações. Quiçá, haja vindo ao meu bestunto, ainda quase adormecido às primeiras horas da matina, um delicioso, porque proibido, beijo de língua que roubei ousadamente de uma esplêndida morena fantasiada de sensual odalisca no carnaval de 1964, nos salões do Maguary. Ou talvez na primeira e inesquecível carreira levada da polícia marchando numa passeata nos idos de Sessenta e Oito. Ou, ainda, no ósculo redentor, amoroso que minha filha me deu ontem de noite, fazendo as pazes depois de um quebra-pau entre nós dois. Ah, os filhos, que jamais esquecem os nossos pecados paternos durante o resto de suas vidas. E nos relegam à eterna condição de heróis e de bandidos.

Pensando melhor e com o necessário vagar, usando a lógica e a razão, deixando um pouco de lado a cumplicidade confusa dos sentimentos e emoções, concluo, de maneira indubitável, que penso mais na vida quando estou alegre do que enfiado na concha da tristeza, pois enquanto em estado sorumbático, imerso em melancolia, só tenho tempo de pensar em recuperar a alegria o mais rápido que me for possível. A muito custo, forcei-me a aprender a não chorar o leite derramado, a morte da bezerra, o tudo acabado entre nós, porque tal atitude negativista a nada nos conduz de bom nem nos traz a desejada redenção do pessimismo em nós instalado mesmo que circunstancialmente. O negócio é bola pra frente e é preciso reconquistar a vida dia após dia. Hoje, me coube pensar no existir de um jeito perfeitamente natural. Depois, saí pra luta, pois o cotidiano me aguardava pronto para ser vivido. Às vezes, pensar na vida nem sequer nos rende uma crônica decente.

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