Apesar do meu parco talento como escritor, geralmente costumo tomar muito cuidado com tudo que escrevo, seja com o que pretendo publicar em futuros livros, seja com estas cotidianas mal traçadas impressas nesse meu cantinho de página de jornal. Sou até um tanto obsessivo quanto a isso. Depois de digitar a crônica, antes de enviá-la ao editor, faço questão de pentear cuidadosamente o texto em busca de possíveis erros cometidos, ou por falha na digitação ou oriundos de minha crassa ignorância da nossa Flor do Lácio inculta e bela, sempre contando com a indispensável ajuda do popular “Pai dos Burros”, porque nunca sei quando vou precisar de seu precioso adjutório. Porém, por mais precauções que se tome, por vezes torna-se impossível evitar algumas falhas e atentados contra o vernáculo, que a gente só vem perceber depois do texto publicado. E aí, não tem mais jeito, porque no meu ofício vale o que está escrito tal e qual acontece no jogo do bicho.
Outro dia, perpetrei dois erros imperdoáveis e dos quais me penitencio antes que algum leitor mais atento me lance a primeira pedra. Não sei onde estava a minha cabeça quando grafei a palavra paçoca com dois esses e parêntese no singular com um esse no final. Sei que errar é próprio da humana condição, mas que direito eu tinha de maltratar tão duramente a nossa já tão maltratada língua pátria? Bons tempos aqueles em que ainda existia a figura do revisor, nosso mais costumeiro bode expiatório e que era sempre o imperdoável culpado pelos nossos erros como os mordomos dos romances policiais eram sempre os primeiros suspeitos do crime. Entanto, com a entrada em cena dos computadores, o revisor acabou sendo extinto pela tecnologia e adeus nossa mamata, nosso salvador muro das lamentações. Sem o indigitado revisor, ficamos entregues à nossa própria sorte não há mais como escapar de nossas aberrações linguísticas.
Ainda me restava uma biológica alternativa, que seria jogar a culpa na minha catarata iniciante, mas logo cheguei à conclusão de que nenhuma doença, por pior que seja, pode ser responsabilizada por nossa obtusidade, nosso desconhecimento da gramática. Portanto, só me resta assumir a minha responsabilidade e ser honesto com meus raros leitores e comigo mesmo. Eu errei de um modo fragoroso, indesculpável e mereço justificadamente todas as críticas que me forem dirigidas, por mais acerbas que sejam. E nem me adianta esconder-me atrás da manjada desculpa de que todo mundo erra, aqui e ali, por que não eu? É agindo dessa maneira covarde que contribuímos para perpetuar, justificar nossos erros e deslizes com os erros e deslizes alheios, mesmo que, muito raramente se concretize a premissa popular de que o errado é que está certo. Todavia, é errando que se aprende, muito embora pessoas haja que jamais aprendem com seus erros e seguem errando vida afora ostentando uma olímpica indiferença pelos prejuízos que vão deixando no rastro de sua passagem.
Alguns amigos escritores, a quem envio minhas croniquetas antes mesmo de mandá-las para o jornal, me telefonaram sem detença, me alertando para meus ortográficos escorregões, tentando me consolar afirmando que tenho um certo crédito junto aos meus leitores mais assíduos, que me perdoarão com generosidade meus desacertos últimos. Agradeci penhoradamente a solícita cumplicidade dos afáveis companheiros, mas lhes dizendo, em resposta, que escritor não tem crédito nem na bodega da esquina. E que escritor é como os goleiros, que podem passar noventa minutos fazendo milagres, mas se derem o azar de engolir um frango no encerrar das luzes da partida, saem do campo tratados que nem um Judas de semana santa. Escritores também são solitários como os artilheiros, aos quais dificilmente se perdoa um gol perdido em horas decisivas. Nosso destino é viver na corda bamba, feito os equilibristas de circo.
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