Airton Monte - Vagabundos Pensares - 8 Julho 2011
Hoje é domingo, dia de feriado universal. Vontade não tenho nenhuma de trabalhar, mas gozar a folga tradicional em toda sua plenitude. Passar o dia de pernas pro ar, sem fazer absolutamente nada como a maioria das pessoas. Vejo os meus vizinhos tirando seus carros da garagem com um ar tão feliz estampado nos rostos que chega a me dar uma discreta inveja desses alegres felizardos. Meus filhos já se mandaram, manhã cedinho, ansiosos para começar o mais breve possível a sua festança dominical. E, em verdade, estão cobertos de razão. Com uma generosidade que não lhes é peculiar, até chegaram a me fazer um discreto e pouco insistente convite para acompanhá-los seja lá para onde forem. Naturalmente recusei a filial oferta de deslocar-me rumo à longínqua Praia do Futuro, porque só em pensar nos terríveis engarrafamentos que certamente haveríamos de enfrentar, preferi restar no confortável sossego de casa, acompanhado dos meus discos, livros e a indispensável televisão a cabo.
Além do mais, por serem as suas ideias de diversão bastante diferentes das minhas, poderia atrapalhar, como um trambolho paternal, o divertimento de meus amados desdobramentos celulares. Não é que eu pense que lugar de velho é em casa ou junto com seus iguais em torno de uma mesa dos botecos preferidos conversando sobre nossos semelhantes interesses. Também não posso me arriscar a deixar a residência sozinha, provisoriamente desabitada, por medo de que, ao regressar, seja vítima da desagradável surpresa de ver o meu suburbano tugúrio invadido e saqueado pelos solertes amigos do alheio que pululam livremente em todos os rincões da cidade. Principalmente agora, nesse momento crítico, em que os policiais ameaçam entrar em greve, deixando-nos mais desprotegidos do que já o somos, mesmo quando os homens da lei estão trabalhando a todo vapor. Certo que tenho, soltos no quintal, os meus diligentes sentinelas caninos, mas sabe-se lá de que artimanhas são capazes os ladrões profissionais.
Tirante esses pequenos problemas concernentes ao quesito segurança, é-me impossível fugir, mesmo aos domingos, da obrigatória labuta de pegar papel e caneta e escrever, por cima de pau e pedra, a compulsória croniqueta do dia antes da estreia do escrete canarinho na insossa Copa América. Tem nada, não. No próximo e bem vindo mês de agosto, é chegado o tempo de tirar as minhas merecidas férias do jornal e meu exaurido bestunto finalmente entrará no ansiado descanso anual. Enquanto isso não acontece, tenho de continuar lavorando, futucando cotidianamente o juízo em busca de assunto para traduzir em palavras feito um padeiro preparando o pão do espírito. Desculpem-me, se acaso o puderem, meus caríssimos, se estou sendo um tanto quanto repetitivo ao falar dos domingos nestas mal traçadas. Porém, cada um escreve do jeito que pode e não como desejaria. Que bom seria, caso houvesse em mim a capacidade de escrevinhar uma obra prima a cada dia. Entanto, estou muito aquém de tal magnífica condição de ser um escriba genial.
Uma de minhas raras qualidades é reconhecer as minhas literárias limitações neste mister que escolhi como ofício ou, quem sabe, haja sido escolhido por ele por razões que me são ignoradas. Deitado a meus pés, meu cachorro me olha, quando em vez, cheio de um carinho e afetividade quase humanos. Alguns podem não acreditar, mas os animais que a gente cria mostram-se capazes de nos transmitir os sentimentos que lhes povoam a alma, se é que os animais possuem alma igual a nós. Pelo menos eu creio que sim e deve haver, disso nem cogito em duvidar, um Deus dos cachorros, e que talvez seja o mesmo em que acreditamos. Penso que todos os animais, sem exceção, vão direto para o céu, porque o inferno não foi criado por eles nem para eles. Estarei eu a divagar, perdido entre tolos e ingênuos pensares? E se realmente estiver, que mal me pode causar tais distraídas divagações, essas elocubrações sem qualquer utilidade prática. Tudo que se pensa tem alguma serventia. Preenche o vazio e evita o tédio e me faz praticar o saudável exercício de rir de mim mesmo.
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