Costumeiramente
recebemos visitas nas manhãs de segunda a sábado ou de segunda a segunda , o
ponteiro do relógio marca dez horas
perfazendo no arco menor um ângulo de setenta e dois graus.Até o
momento, não recebemos nenhuma dessas previsíveis visitas. No vazio da sala
onde leio um livro de contos de um
escritor local, ponho a brochura de lado
momentaneamente para outros afazeres inúteis. Abro o “livro de notas” e vou
verificar meu correio eletrônico esperando alguma mensagem significativa. Em
meio a um sem número de mensagens insignificantes de correntes espirituais e
outras menos votadas, me deparo com uma no mínimo burlesca - Uma oferta, uma
pechincha, na linguagem do vendedor da mensagem, apartamentos novos que estão sendo construídos ( ou já
estão prontos, não lembro bem!) . No reclame, o vendilhão aponta um preço cujo
valor representa a soma de uma vida inteira de numerários do meu modesto sal,
ora, logo eu um simplório amanuense que não consegue nem quitar algumas letras
de baixo valor vencidas a tempos ! Brincadeira tem hora!
Eis que
chega o primeiro visitante ao receptivo tugúrio, trata-se de uma diarista que
mora do outro lado da urbe, chega com a tez tostada do tórrido sol do meio da
manhã, sem disfarces ela afirma ter vindo de um “centro espírita” que fica por
trás do mercado público. Ela troca vários diálogos ininteligíveis com a
empregada da casa vizinha que a essa hora aproveita os momentos de ócio da
faina do lar de nossa vizinha solteirona. Depois de uma hora após a primeira
visita, passaram um sem número de pessoas pousar a sombra do alpendre de nossa choupana. Um vendedor de vassouras
que gritava seu pregão a plenos pulmões, o vendedor de bilhetes de loterias, a
anã que mora no fim da rua deu o ar de sua graça por estas paragens com suas
estórias repetidas de sempre, ainda um gari gazeando a hora de trabalho dá os
bons dias aos que aqui estão. Dentre estes
personagens vários, aparece uma senhora que costumeiramente passava por
ali, já anda por seus setenta e poucos anos,
celibatária convicta, a
saudosista mulher contava causos do seu tempo de aluna interna no grupo escolar
de sua cidade, citava ela namoricos,
artes juvenis do seu tempo, e comparava com os da geração atual. Outra matrona,
pegando o gancho na prosa da outra, lembrava de situações cognitivas, falava
ela de regras ortográficas, lembrando ter aprendido que antes das letras pê e
bê se deve usar única e exclusivamente a letra ême.
As horas
correm, o sol está a pino, os ponteiros do relógio estão próximos de se juntarem
a formar a hora grande. Nesta rua
solitária só alguns redemoinhos de vento mudam a paisagem erma da rua de pedra
tosca. Volto ao livro que lia até bem pouco tempo e sou interrompido um
instante por minha mãe que convoca toda prole para o repasto sagrado do dia a dia. É hora do almoço.
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